Mudar de hábitos para viver melhor

A medicina do futuro, atualmente ensinada nas universidades, é baseada nos quatro “P”. É capaz de Predizer e, por isso, de Prevenir a doença, e é desenvolvida de forma Personalizada e Participada. É esta a lógica pela qual se rege a Unidade Universitária de Medicina de Estilos de Vida, localizada no Hospital CUF Tejo e no Hospital CUF Descobertas. “O que mais nos preocupa, nos últimos 50 anos do século XX e nos últimos 20 do século XXI, são as doenças não comunicáveis, as chamadas doenças crónicas. Passámos a ter muitos mais anos de vida e mais doenças ao longo da vida. E sabemos o quanto o estilo de vida e o comportamento influenciam essas doenças, na sua maioria preveníveis, sobretudo com dois dos fatores de que mais ouvimos falar quando falamos em estilo de vida: a alimentação e a atividade física”, explica Conceição Calhau, Coordenadora da Unidade Universitária de Medicina de Estilos de Vida e Professora Catedrática da NOVA Medical School.

Conceição Calhau

Criada no âmbito de uma parceria entre a CUF e a NOVA Medical School – Faculdade de Ciências Médicas da Universidade NOVA de Lisboa, a Unidade Universitária de Medicina de Estilos de Vida reconhece as áreas da nutrição e dos estilos de vida como prioridades, não apenas no ensino e na investigação, mas também na prática clínica. “O nosso objetivo é poder prestar cuidados neste conceito da prevenção e trabalhar variáveis como a alimentação, a prática de atividade física, uma vida ativa, o sono, a flora intestinal e o próprio ritmo circadiano – que são as variações nas funções biológicas ao longo de 24 horas”, refere Conceição Calhau. A estes objetivos juntam-se outros, trabalhados em conjunto com outras especialidades, como Medicina do Sono, Endocrinologia e Gastrenterologia. A gestão do peso e os primeiros 1111 dias de vida – o período que abarca os meses anteriores à gravidez, a gestação e os primeiros dois anos de vida – são áreas especialmente importantes. “São cada vez mais as pessoas que procuram a nossa consulta para apoio na gestão de peso, que começa a ser uma prioridade que não tem a ver com o verão, o que é positivo, porque revela haver uma preocupação que não é apenas estética”, realça a professora. “A unidade também é muito procurada para dar resposta a queixas gastrointestinais que precisam de um despiste médico prévio e, depois, de um forte apoio com intervenção nutricional. Na base da consulta estaremos também a focar a atenção para alterações da microbiota intestinal que estavam desencaixadas de qualquer outro seguimento. Aquilo que nós temos a oferecer aos doentes, além das alterações alimentares que têm de fazer e que são circunscritas no tempo – porque não são definitivas, nem o devem ser –, é o reequilíbrio da flora intestinal”, explica.

Conceição Calhau

Conceição Calhau assume que a prevenção devia ser uma prioridade. Contudo, são ainda poucos os doentes a partilhar esta perspetiva. “A cultura dominante na saúde é a de que procuramos o médico quando precisamos de ajuda, ou seja, quando alguma coisa já não está bem. É uma cultura que tem de mudar.” Essa também é uma das linhas de ação da unidade. “Quando falamos em direito à saúde, temos de considerar que isso também passa pelas pessoas desenvolverem competências, de modo a saberem o que fazer para cuidar da sua saúde. E isso passa por explicarmos, de acordo com exames que podemos pedir – fazer a avaliação da composição corporal, estudar a microbiota intestinal, ver características genéticas associadas ao metabolismo –, com os quais podemos identificar suscetibilidades das pessoas e, assim, prevenir doenças.” A ideia é que uma pessoa que saiba à partida que tem suscetibilidade para uma deficiência de ácido fólico ou para acumular tecido adiposo tomará de forma mais consciente as decisões de comportamento alimentar ou de estilo de vida que lhe permitam conservar a saúde. Este nível de conhecimento só é conseguido através de uma prática personalizada da medicina. “É muito importante os doentes terem consciência de que vão a uma consulta diferenciada. Não vão a uma consulta que lhes vai permitir falar apenas sobre a alimentação. Precisamos de fazer um estudo bastante detalhado de cada uma das pessoas para que, de facto, seja personalizado”, explica Conceição Calhau.

A investigação é uma das principais componentes da unidade, havendo neste momento vários estudos em curso. Um deles centra-se em deficiência de iodo, um problema significativo a nível nacional. “A capacidade cognitiva e o próprio quociente de inteligência estão muito dependentes da exposição ao iodo durante a gravidez – e a deficiência de iodo é um ponto que precisamos de trabalhar. Neste momento, estamos a processar dados recolhidos no Hospital CUF Descobertas e a monitorizar o estado do iodo nas grávidas”, explica a Coordenadora. Outro estudo, este já publicado numa revista científica internacional, avaliou a microbiota intestinal em doentes com COVID-19. “Verificámos que a microbiota no momento da infeção com o novo coronavírus era muito determinante do prognóstico, que era pior se houvesse uma menor diversidade de flora intestinal.”

 

Fotografias de António Azevedo (4SEE)

 

 

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Publicado a 02/11/2022