Bernardo Lage Raposo

Tocar, agir, viver

Bernardo Lage Raposo, Produtor de televisão, 41 anos

Em setembro de 2016, com 37 anos, recebia o diagnóstico de cancro do testículo. Por ter estado atento aos sinais do corpo e ter recorrido sem demoras a ajuda profissional, ultrapassou todos os obstáculos e venceu o cancro.

Há coisas que não se explicam, simplesmente vivem-se ou sentem-se. E se estivermos atentos à nossa voz interior, intuição, coração ou o que queiram chamar-lhe, saberemos o que fazer no momento certo e tudo se irá desenrolar de forma tão natural que muitas vezes nem acreditamos na forma como tudo aconteceu. E é neste cenário em que se dão os acasos do destino. Foi exatamente o que aconteceu comigo quando, sem saber porquê e sem explicar, senti que tinha de ver uma entrevista com um ator, que teve cancro do testículo.

Eu não vi o programa no dia em que foi emitido (17 de setembro de 2016), e com a agitação do dia-a-dia passou-se quase uma semana. Ou seja, sem saber explicar porquê, só no dia 22 de setembro é que me sentei em frente à televisão e senti “é hoje que vou ver a entrevista“.

Após ter assistido à entrevista ficou-me gravada na memória uma frase proferida pelo ator: “toquem-se sem pudor!“. 

"Por ter feito imediatamente o rastreio logo após ter detetado algo diferente, permitiu-me no espaço de uma semana apenas fazer rastreio, diagnóstico, análises de sangue, TAC, Ecografia e cirurgia. E por isto mesmo, não posso deixar de reforçar para que façam o rastreio com alguma periodicidade, pois detetando cedo este tipo de doenças, mais fácil será a cura, o seu tratamento e a recuperação. "

Toda a entrevista, incluindo a história dele, ficaram a pairar na minha cabeça em conjunto com a frase “toquem-se sem pudor!“. E no dia seguinte, decidi fazer a auto-palpação. Isto porque percebi que este tipo de cancro poderá ser de facto silencioso, indolor e invisível.  Ao fazer o “dito toque” percebo que algo se passava no meu testículo direito, refiro-me ao tamanho e rugosidade que nada tinha a ver com o normal.

Paralisei. Entrei em estado de choque e pânico. E as inevitáveis questões “Isto não me está a acontecer!", “Isto não é possível“, “Não acredito!“, “Não é nada de certeza, não faz sentido!“ atravessaram-me a mente. Percebi que não só o cancro, mas todas as outras doenças, pairam à nossa volta através de amigos de amigos, amigos, tios, avós, colega do trabalho, figuras públicas e de certo que será como mecanismo de defesa achamos que é uma realidade que nunca nos tocará. Até que chega o dia em que pode realmente tocar-nos à porta.

O fim de semana passou, e quando acordei na segunda-feira seguinte (dia 26 de setembro) percebi que tinha de encarar o problema, e por isso mesmo decidi marcar consulta de Urologia. E aqui, mais uma vez, não consigo explicar o porquê de ter escolhido o Hospital CUF Cascais, nem mesmo o dia da consulta com aquele médico Urologista específico. Foi simplesmente um impulso, que não controlei, e quando o fiz tive a certeza absoluta de que aquela era a melhor escolha que eu poderia fazer no momento. A consulta fica agendada para o dia seguinte, terça-feira dia 27 de setembro de 2016, com o Dr. Artur Sabugueiro Palmas.

Se poucas dúvidas eu já tinha de que realmente tinha um tumor, na consulta rapidamente tenho a confirmação. Daí que quando o médico me confirma o diagnóstico, sofro o embate da confirmação, mas automaticamente passei a mergulhar no pragmatismo, delineando rapidamente os próximos passos de modo a vencer esta maldita doença. Tenho de realçar o profissionalismo e postura do Dr. Artur Palmas, na forma como me acolheu e na forma cuidadosa com que me transmitiu a notícia. Foi de extrema importância para mim e nunca será suficiente agradecer-lhe.

 

jovem com cão na praia

Até esta altura não tinha ainda partilhado com ninguém o que se passava, isto pelo simples facto de não querer que os outros sofressem com a dúvida, até de facto ter a confirmação de que se tratava de um tumor. E por isto mesmo, fui sozinho à consulta e recebi a notícia sem o apoio de família ou amigos por perto. Não me arrependo porque ter alguém próximo naquele momento iria de certeza fazer-me vacilar e vitimizar, tornando-me mais vulnerável emocionalmente, e quiçá toldar o meu discernimento e pragmatismo que foram a minha alavanca para a cura.

É realmente em situações limite e extremas que vamos buscar forças e ânimo para seguir em frente, mesmo quando achamos que não somos suficientemente bons ou fortes, como que sendo invadidos por um instinto de sobrevivência que nos torna guerreiros prontos a enfrentar qualquer exército.

O Diagnóstico

Desde logo delineei os passos seguintes com o Dr. Artur Palmas, que se traduziram na colheita de de sangue no próprio dia, de uma TAC e de uma ecografia realizadas no dia seguinte, de modo a confirmar o diagnóstico e a obter informações mais detalhadas sobre a extensão deste tumor. 

Ao realizar a ecografia, tive a confirmação de que realmente se tratava de um cancro, restando-me apenas esperar pela realização da TAC para saber se haviam metástases à distância.

O próprio processo de preparação e realização da TAC não é algo fácil por si só, pois implica um medo latente pela extensão do verdadeiro problema e por sermos colocados à “mercê” de uma máquina que ditará um “diagnóstico frio”. A única forma que arranjei de manter o foco e concentração, durante a realização deste exame, foi respirar lenta e profundamente, pois percebi que estava a um passo de um ataque de ansiedade, tendo em conta todo o cenário e conjuntura. Mais uma vez, tenho de reforçar o profissionalismo e carinho que tive da equipa do Hospital CUF Cascais, que me orientou na realização destes 2 exames. A sensibilidade, o cuidado e a atenção destes profissionais, dada a minha fragilidade numa situação como esta, tornou tudo mais fácil. E tudo mais simples se tornou, quando esta mesma equipa me comunicou, que a TAC não acusava a existência de qualquer tipo de metástases. Aliviado e fortalecido por ter recebido uma tão boa notícia, foi mais fácil lidar com o próximo passo.

Faltava obter o resultado das análises de sangue com os marcadores tumorais que esperava que estivessem de acordo com um cenário mais favorável, face aos resultados dos exames de imagem.

Confirmou-se o expectável, ou seja, de que se tratava de um tumor, mas que não haviam metástases. Na consulta médica delineou-se o próximo passo que consistia no agendamento da cirurgia para a remoção do testículo afetado e a sua substituição por uma prótese. A análise ao microscópio do tumor permitiu um diagnóstico, ao pormenor, das características do tumor e a sua extensão local. A cirurgia aconteceu num dia que jamais irei esquecer, o dia 4 de outubro de 2016.

O apoio da família e dos amigos

Durante este processo difícil, fiz questão de me rodear por aqueles que realmente são importantes para mim e, mesmo que eu não quisesse, ninguém permitiu que ficasse sozinho em momento algum. Paralelamente, fui recebendo muitos telefonemas, mensagens e as mais variadas provas de amor e amizade. Foi esta inundação de carinho e de amor, que me fez viver de forma tranquila e suave os dias que antecederam a operação. Por diversas vezes consegui mesmo nem me lembrar do que tinha pela frente e fui vivendo o momento presente, o chamado “aqui e agora“. 

O tratamento cirúrgico

Chegou o tão aguardado dia da cirurgia. Calmo, mas com uma vontade indescritível de resolver o assunto e de que tudo passasse rapidamente. 

Tinha indicação para fazer check-in no Hospital CUF Cascais às 17h30, de modo a proceder aos preparativos para cirurgia. Alguns dos meus amigos mais próximos fizeram questão de estar presentes, conjuntamente com a minha mãe e irmã. Toda a equipa do Hospital CUF Cascais, desde médicos, enfermeiros e auxiliares, fez com que todos os momentos, pré e pós-cirurgia, passassem de forma mais suave. A ansiedade, que inevitavelmente se sente em situações destas, foi atenuada pela anestesia, profissionalismo de toda a equipa médica e pelo apoio da família e amigos presentes. Ao longo da preparação para a cirurgia, nomeadamente na deslocação para o recobro e para a sala de anestesia (na sala operatória não tenho qualquer tipo de memória motivada pelo efeito da anestesia) senti uma força e coragem que me fizeram viver aqueles momentos de forma muito pacífica.

Quando acordei, senti essa mesma força, reforçada pelo carinho de todos os que lá estavam para me apoiar.

Na cirurgia foi retirada uma amostra do tumor para que pudesse seguir para a Anatomia Patológica. Acabei por saber o tão aguardado resultado através de um telefonema do Dr. Artur Palmas. No meu caso, confirmou-se que se tratava de um seminoma (tumor do testículo), em estadio I. 

Já em consulta, o Dr. Palmas deu o seu parecer em relação ao tratamento a seguir. E na sua opinião já não seria necessário realizar qualquer tipo de tratamento (tal como a quimioterapia), bastando apenas fazer vigilância apertada nos meses que se seguiam. No entanto, e por ser sempre bom em casos destes, aconselhou-me a ter uma segunda opinião médica, neste caso com o médico Oncologista Dr. Diogo Alpuim Costa, seu colega do Hospital CUF Cascais

A decisão multidisciplinar

Marquei consulta com o médico sugerido, de modo a ter a tal segunda opinião. Aqui tenho de frisar, mais uma vez, o profissionalismo e carinho com que fui recebido e tratado por toda a equipa do Hospital CUF Cascais, em especial pelo Dr. Diogo Alpuim Costa e a sua equipa. Dado todo o enquadramento da situação, que no fundo se prolongava com a ansiedade de mais uma espera de dias, consultas e pareceres, o meu estado de espírito não era obviamente o mais sereno. O meu grande receio era ter de enfrentar a quimioterapia, estando disposto a tudo, menos a ser sujeito a um tratamento como este.

Mas com o profissionalismo e sensibilidade do Dr. Diogo, fui desmistificando este receio na minha cabeça. Automaticamente qualquer dos desfechos que tinha à minha frente pareciam simplificar-se, pois foi-me dado a ver que a taxa de sucesso, em casos similares e até piores do que o meu, era enorme. Nesta primeira consulta foi-me também explicado que o médico Oncologista só toma uma decisão definitiva em relação ao tratamento após uma reunião com a equipa multidisciplinar de Oncologia.

Foi-me, então, comunicada a decisão da referida reunião. O Dr. Diogo explicou-me que, com base nas novas análises de sangue que tive de fazer e no resultado da Anatomia Patológica,  a equipa multidisciplinar teria decidido que o tratamento passaria por realizar um ciclo de quimioterapia. Foi meramente preventivo, mas dado o tamanho que o tumor tinha acharam que seria o mais prudente. Explicou-me também os efeitos secundários desta quimioterapia, que sendo meramente “preventiva” e de curta duração, diminuía em muito o aparecimento e a intensidade dos seus efeitos.  Dos possíveis efeitos secundários informaram-me de que poderia sofrer uma ligeira queda de cabelo nas semanas seguintes (mas que não era garantido), anemia (que poderia também não acontecer), baixas nas minhas defesas e que poderia certamente ter sintomas como azia e enjoos. 

Antes da realização da sessão de quimioterapia propriamente dita, tive mais uma consulta com o Dr. Diogo Alpuim Costa, durante a qual foram assegurados todos os requisitos necessários à realização deste tipo de tratamento. Mais uma vez foi-me transmitido que este ciclo de quimioterapia seria relativamente fraco, meramente “preventivo”, e que não teria necessidade de permanecer muito tempo no Hospital de Dia para o realizar.

Nesta consulta fui ainda, por incentivo e conselho do Dr. Diogo Alpuim Costa, encaminhado para uma consulta especializada de preservação de fertilidade, processo esse que teria obviamente de ser realizado imediatamente. Só após este processo é que foi agendada a sessão de quimioterapia.

Diogo Alpuim Costa, médico Oncologista na CUF

O tratamento no Hospital de Dia

Chegou a hora de entrar na sala do Hospital de Dia no Hospital CUF Cascais onde fiz a quimioterapia. Este cenário intimidou-me, mas por uns ligeiros segundos, pois automaticamente fui acolhido por uma equipa de enfermagem de excelência. A enfermeira Cristina Freitas, responsável por administrar o tratamento, e a sua Auxiliar Maria João Sousa receberam-me com verdadeiro carinho, algo que nunca poderei esquecer, pois fez toda a diferença naquele momento da minha vida, tal como acredito que fará na vida de outros doentes que ali façam o mesmo tratamento.  Esta receção calorosa, e acima de tudo genuína, fez-me viver aquele momento com uma ligeireza tal, que desmoronou por completo o estigma da quimioterapia.

Não posso deixar de referir um momento que me marcou e que há de ficar no meu coração para sempre. Já sentado no cadeirão, aquando da preparação e administração cuidadosa do tratamento endovenoso pela enfermeira Cristina, a auxiliar Maria João agarrou-me na outra mão e confortou-me com as suas palavras e festinhas carinhosas. Este momento emocionou-me profundamente, tendo sido, sem dúvida alguma, essencial para que eu vivesse aquela experiência de forma mais tranquila.

Paralelamente, tive outro conforto que passou pelas visitas periódicas durante o tratamento do Dr. Diogo Alpuim Costa, que me deu mais confiança para enfrentar aquela realidade e acima de tudo transmitiu-me um sentimento de pertença e de união a um grupo de pessoas excecionais, que se sabem preocupar e cuidar dos outros. E são equipas como esta que fazem realmente a diferença neste mundo, tornando-o bem melhor através do amor genuíno com que fazem a sua atividade. Foram cerca de duas horas e meia, que passaram muito rapidamente e que me levaram a deixar o hospital naquele dia de coração cheio com o sentimento de prova superada.

 

Etapas superadas

Desde então, realizo consultas de controlo com o Dr. Diogo Alpuim Costa e faço os exames definidos para o meu contexto. E cada vez que entro no Hospital CUF Cascais sinto-me realmente em casa, com  um verdadeiro prazer em rever toda aquela equipa que me recebe sempre de braços abertos.

Nessa equipa tenho de destacar mais uma vez o Dr. Diogo Alpuim Costa, a enfermeira Cristina Freitas, a Maria João Sousa, a Vanda Silva e o Paulo Pereira, que se tornaram pessoas com um lugar muito especial na minha vida.

Diogo Alpuim Costa refere ainda que:

A última observação do Bernardo em consulta foi no dia 22 de setembro de 2020, durante a qual foi confirmado o estado de remissão completa da sua doença oncológica.

O prognóstico depende do tipo e da extensão do cancro do testículo. A sobrevivência aos 5 anos é superior a 95% para os doentes com seminoma localizado no testículo. Mesmo em doentes com doença mais avançada podem vir a ser curados, uma vez que se trata de uma doença que é, em regra, muito quimiossensível. 

Deverá encorajar-se o autoexame para os jovens entre os 15 e os 35 anos de idade (mensalmente) e no caso de alterações anormais da morfologia do testículo, deverá consultar-se a opinião de profissionais especializados na área. 

 

homem jovem sorridente

A minha mensagem

Moral desta história real de alguém que teve uma história de superação de um cancro: apostar no conhecimento e na palpação do nosso corpo (neste caso os testículos) e face a “algo anormal” recorrer o quanto antes a ajuda especializada.

No meu caso, em uma semana realizei toda a investigação para se perceber qual era o meu problema de saúde e a sua verdadeira gravidade. E por isto mesmo, não posso deixar de reforçar para que façam o “vosso próprio rastreio” com alguma periodicidade, pois detetando cedo este tipo de doenças mais fácil será o caminho para um tratamento e recuperação eficazes e, como tal, para a CURA!

E termino com este apelo que não irei parar de repetir, “TOQUEM-SE SEM PUDOR!“, fiquem atentos ao vosso corpo, ele comunica connosco.

Obrigada Hospital CUF Cascais!

Cancro do Testículo

O que precisa conhecer sobre este tipo de cancro urológico, mais frequente no homem jovem.

homem a fazer ressonancia magnética diagnóstico oncologia