Doenças periodontais:
As doenças periodontais são silenciosas e, por isso, é importante manter a vigilância. Susana Noronha, médica dentista, explica-lhe tudo o que precisa de saber.
Há vários tipos de patologias que podem afetar a nossa boca, sendo as doenças periodontais uma delas. Nestas doenças - tal como em tantas outras - a chave para o sucesso é o diagnóstico precoce, agir rapidamente quando identificadas e, muito importante, mantê-las sob vigilância. Susana Noronha, médica dentista especialista em periodontologia pela Ordem dos Médicos Dentistas, explica-lhe que doenças são, que tipos existem, os cuidados a ter a nível de saúde oral para reduzir o risco de as vir a desenvolver e como podem ser tratadas. Conte também com o testemunho de Tatiana Melo, diagnosticada com periodontite.
Doenças periodontais em Portugal
A doenças periodontais são uma doença prevalente em Portugal, embora não se saiba exatamente quantos casos existem: "São precisos mais estudos e com populações alargadas para nos permitir fazer uma análise epidemiológica das doenças periodontais em Portugal, para que assim consigamos caracterizar a população no tipo de doença periodontal e classificar de acordo com o grau de doença periodontal. No entanto, há alguns anos, em 2015, a Direção-Geral da Saúde promoveu um estudo de prevalência das doenças da cavidade oral. Verificou-se que uma das doenças periodontais, a periodontite, tinha uma prevalência de cerca de 11%. Portanto, é uma doença prevalente", refere Susana Noronha.
O que são doenças periodontais?
"As doenças periodontais são as doenças que afetam o periodonto, que é tudo o que está à volta do dente: a gengiva, o osso que mantém o dente na sua posição e um ligamento, que é muito importante, que une o osso ao dente. Todos esses tecidos que estão à volta do dente são os tecidos periodontais", explica Susana Noronha.
De acordo com a médica dentista, "de uma forma geral, podemos dividir as doenças periodontais em gengivite e periodontite. A gengivite é uma inflamação nas gengivas e, portanto, só afeta uma parte do periodonto. Pelo contrário, a periodontite afeta os restantes compartimentos do periodonto, nomeadamente o osso. Na gengivite, uma das manifestações é o sangramento das gengivas, assim como inflamação e inchaço. Esta é uma doença muito prevalente e efetivamente tem um lado bom, porque é uma doença reversível no sentido em que, se nós eliminarmos a placa bacteriana - estas doenças são todas provocadas por bactérias -, a gengiva deixa de estar inflamada e conseguimos controlar a gengivite". E é mesmo importante controlar esta doença, pois, a gengivite pode evoluir para periodontite nos doentes que já tenham essa suscetibilidade. "A periodontite afeta os outros tecidos, leva à perda de suporte no dente e, em último caso, se não tratada e controlada, os dentes podem-se perder sem qualquer tipo de cárie", alerta a médica dentista.
Impacto das doenças periodontais na saúde geral
"A periodontite é uma doença crónica que tem efeitos locais e efeitos sistémicos", esclarece Susana Noronha, referindo como principais efeitos na cavidade oral:
- Dentes que vão ficando mais compridos
- Gengivas que ficam retraídas
- Maior mobilidade dos dentes (abanam)
- Possibilidade de mau hálito associado
Por outro lado, "há também consequências da periodontite na saúde sistémica, pela relação que esta patologia tem com outras patologias sistémicas. A diabetes é um excelente exemplo, mas também a hipertensão, as doenças cardiovasculares de uma forma geral e ultimamente tem-se feito muita investigação sobre a relação da periodontite com a doença de Alzheimer. Há muitas patologias que pela sua componente inflamatória podem levar a esta relação com a periodontite. Sabe-se atualmente que essa relação entre as doenças tem muito a ver com a resposta inflamatória que o nosso organismo tem face à presença de algo estranho, seja bactérias ou outro fator que provoca essa reação", explica.
Grupos de risco
"Consideramos fatores de risco todos os fatores que, quando associados a uma determinada patologia, levam ao aumento da sua progressão ou da sua severidade. Ou seja, a doença pode ficar mais grave com aquele fator de risco", começa por explicar Susana Noronha. No caso da periodontite, "há vários fatores de risco; um deles é o tabaco. Os doentes fumadores respondem pior ao tratamento periodontal, podendo ser mais difícil de tratar numa fase inicial, e correm maior risco de recidivas da doença. Faz parte do nosso plano de tratamento a todos os doentes que tenham hábitos tabágicos um aconselhamento na cessação tabágica. Outro fator de risco importante é a diabetes não controlada metabolicamente. Existe uma relação bidirecional entre estas duas doenças: um doente diabético tem mais tendência para piorar a sua situação periodontal e o mesmo se verifica num doente periodontal; se for diabético tem maior tendência para ter um descontrolo metabólico. Daí a importância extrema do controlo periodontal em todos os doentes, mas nesses doentes em particular", salienta.
A periodontite é hereditária?
A resposta de Susana Noronha quanto à hereditariedade da periodontite é muito assertiva: "É um mito. A periodontite não é uma doença genética ou hereditária. Durante muitos anos acreditou-se que sim, no sentido em que passava de pais para filhos nos cromossomas. Ainda há muitas pessoas que têm essa ideia e que pensam que, como é uma doença genética / hereditária, não há nada a fazer e isso não é verdade. É uma doença que se controla. O que acontece é que, tal como noutras doenças crónicas - por exemplo, diabetes ou hipertensão -, há uma maior suscetibilidade de a vir a desenvolver. Isto significa que se os nossos pais tiverem periodontite, nós temos mais tendência ou predisposição para vir a sofrer da doença. Daí a importância do diagnóstico precoce e da prevenção".
Prevenir as doenças periodontais: cuidados de higiene oral a ter
"As doenças periodontais são provocadas por bactérias. Escovar os dentes, pelo menos duas vezes ao dia, permite eliminar essas bactérias diariamente", afirma Susana Noronha. "As bactérias têm um processo de crescimento que faz com que se tornem mais agressivas à medida que se vão acumulando. Ao escovarmos os dentes duas vezes ao dia estamos sempre a interromper a organização das bactérias e não deixamos que elas cheguem a provocar doença", justifica.
Mas para eliminar eficazmente a placa bacteriana não basta escovar os dentes. É também importante utilizar "meios de limpeza entre os dentes, local privilegiado para as bactérias se acumularem e eventualmente levarem ao desenvolvimento de doença. A escova permite-nos limpar as várias superfícies dos dentes (as que estão ao lado das bochechas, as que estão ao lado da língua e as mastigatórias), mas não nos permite limpar entre os dentes. Temos sempre de associar um fio dentário, ou um escovilhão", reforça.
Não faça isto:
Trincar ou roer coisas com os dentes pode provocar traumatismos na gengiva e, consequentemente, reações no periodonto.
Não adie a consulta com o seu dentista
Além das técnicas de higiene oral, "outra medida muito importante na prevenção das doenças periodontais é a consulta frequente do dentista. Estas doenças têm uma característica muito importante: são silenciosas, não doem. Uma pessoa com gengivite não sente dor, que é o sintoma que na maior parte das vezes nos leva ao dentista. Estas doenças vão progredindo ao longo da vida sem grandes sinais e, se não se acha estranho sangrar-se das gengivas, vai-se deixando passar e as doenças vão evoluindo. O controlo periódico no dentista, no periodontologista ou no higienista oral é fundamental para avaliar clinicamente a gengiva. Para isso utilizamos uma sonda, que é uma régua que mede os espaço entre a gengiva e o dente. Se esse espaço estiver aumentado, pode ser sinal de doença e um controlo periódico, uma avaliação pelo clínico, é crucial", salienta a especialista em saúde oral.
Sabia que...
A gengiva não está colada ao dente. Existe um espaço entre a gengiva e o dente e é importante limpá-lo.
E, agora, a pergunta mais importante: com que frequência devemos visitar o nosso médico dentista assistente? Susana Noronha responde: "Uma pessoa sem problemas deve fazer consultas de rotina no dentista duas vezes por ano. São consultas que têm como principal objetivo prevenir. O resultado do tratamento é mais favorável quanto mais precocemente conseguirmos controlar a doença. Nas pessoas que já têm o diagnóstico de doenças das gengivas, o controlo é para toda a vida e o intervalo das consultas deve ser determinado de acordo com a situação. É possível que o médico estabeleça um intervalo de consultas de três em três meses, portanto, quatro vezes por ano. Nessas consultas, o profissional de saúde oral avalia a situação e determina se é necessário algum tratamento adicional ou se conseguimos estabilizar e controlar a doença periodontal, não sendo necessário nenhum tratamento a não ser a manutenção".
O tratamento das doenças periodontais
"O tratamento das doenças periodontais consiste em eliminar a placa bacteriana e o tártaro, que se podem acumular ao longo da superfície da raiz. Porquê? Porque o espaço entre a gengiva e o dente fica maior, mais profundo, e as bactérias acumulam-se aí. Essa é uma zona que o doente já não consegue limpar. A limpeza mais profunda realizada pelo médico dentista chama-se alisamento radicular e tem como objetivo eliminar as bactérias e o tártaro, tornando a superfície da raiz lisa e compatível com a nova inserção dos tecidos. Os tecidos que se perderam não voltam a crescer, mas cicatrizam de forma a que nós consigamos controlar a doença", explica Susana Noronha.
"O tratamento periodontal pode incluir também uma fase cirúrgica", afirma, explicando que "em algumas pessoas, em que a situação está mais evoluída, pode ser necessário um procedimento cirúrgico, que nos ajuda a chegar a zonas dos dentes mais profundas, onde seria difícil chegar sem descolar a gengiva. Posteriormente, é a fase de manutenção, que é para toda a vida e é crucial para manter os resultados que conseguimos obter com as fases anteriores".
Periodontite na primeira pessoa
Tatiana Melo descobriu que tinha periodontite quase como que por acaso. Não apresentava qualquer tipo de sintomas e foi numa ida ao dentista que se colocou a hipótese de ter uma doença periodontal: "Eu usei aparelho nos dentes durante dois anos e foi na consulta em que o retirei que o dentista verificou que a minha gengiva estava retraída. Aconselhou-me a procurar um médico dentista especialista em periodontite", conta-nos. Na família de Tatiana Melo já havia histórico desta doença, um fator que, como referido, pode aumentar a predisposição para se desenvolver periodontite. "Marquei consulta, fiz alguns exames, e confirmou-se o diagnóstico de periodontite", refere Tatiana Melo. No seu caso específico, o tratamento envolveu "uma cirurgia às gengivas, para a limpeza das raízes e a fase seguinte foi a de manutenção, que consiste, basicamente, numa limpeza muito profunda aos dentes". Hoje em dia, Tatiana Melo não vê a sua vida impactada pela periodontite, apenas tem de ter alguns cuidados no seu dia a dia: "Faço a lavagem correta dos dentes. Além da escova de dentes, utilizo escovilhões de várias medidas, de acordo com o distanciamento que tenho entre cada dente, para que tenha realmente a certeza de que a lavagem é feita corretamente". Outra coisa que não pode mesmo falhar é a consulta de rotina, marcada na agenda de Tatiana a cada três meses.
As vantagens de ter a Medicina Dentária inserida na rede CUF
"É um privilégio os médicos dentistas estarem inseridos numa rede hospitalar. Não se pode dissociar a saúde oral da saúde geral e um doente que tem problemas na cavidade oral é um doente que não tem saúde, está com uma patologia para tratar. Além disso, há patologias comuns, como a diabetes, a hipertensão, as doenças cardiovasculares, que podem ter repercussões na cavidade oral", afirma a médica dentista Susana Noronha. Tatiana Melo concorda com este ponto: "A vantagem é que, estando eu a ser tratada na medicina dentária na CUF, se eu precisar de outros tratamentos, de outras especialidades, encontro nesta rede todos os recursos de que possa precisar".
Além disso, salienta Susana Noronha, "é importantíssimo para qualquer pessoa ter a sua equipa médica integrada, pois permite uma melhor comunicação entre os médicos, que podem até fazer reuniões de discussão da situação. Ambas as partes têm muito a beneficiar com isso, mas quem fica efetivamente a ganhar é o doente porque tem a sua equipa clínica, que muitas vezes é um conjunto de médicos de várias áreas, a promover um plano de tratamento que seja adequado ao seu caso e uma abordagem de manutenção e de controlo a longo prazo".