A importância dos primeiros 1000 dias de vida
O tempo que decorre entre a conceção aos 2 anos de vida é um período de significativo desenvolvimento para o bebé e pode ter um impacto na sua saúde futura.
Cada vez mais se reconhece a importância que os primeiros 1000 dias da vida de um bebé podem ter na nossa vida, mesmo já em adultos. Durante este período, que vai desde a conceção aos 2 anos de idade (24 meses) da criança, o bem-estar da mãe e do bebé estão fortemente interligados e ocorre um desenvolvimento muito significativo de vários órgãos - especialmente do cérebro -, e sistemas, como o imunitário, e funções da criança.
O que nos diz a ciência
É durante os primeiros 1000 dias de vida que as principais bases da nossa vida adulta são construídas e este é um período com grande potencial, mas também vulnerabilidade. Vários trabalhos científicos desenvolvidos nos campos da Neurociência, Biologia e desenvolvimento infantil têm fornecido dados relevantes acerca da importância que fatores como a nutrição, relações e ambiente podem ter no nosso futuro. Existem ainda evidências de que os efeitos negativos resultantes de uma má nutrição e experiências adversas durante os primeiros 1000 dias de vida podem mesmo passar de uma geração para a seguinte.
O cérebro do bebé
É nos primeiros 1000 dias de vida que o cérebro do bebé sofre um maior e mais rápido desenvolvimento. Sabia que à 4ª semana de gestação o cérebro do bebé tem cerca de 10 mil células e na 24ª semana já tem cerca de 10 mil milhões? Por isso, satisfazer as necessidades do bebé é de extrema importância, especialmente durante este período da sua vida.
A nutrição tem um papel fundamental, devendo-se garantir que a alimentação feita durante a gravidez fornece ao bebé as quantidades certas de proteína, ácidos gordos, ferro, iodo, zinco e ácido fólico. Estes são nutrientes essenciais para o desenvolvimento do cérebro durante a gravidez. Se, pelo contrário, houver carência de um ou mais destes elementos, há maior risco de defeitos congénitos, atrasos no desenvolvimento e défices cognitivos.
Papel da nutrição nos primeiros tempos de vida
A alimentação tem um papel de grande relevância no desenvolvimento de qualquer criança. Aquilo que a grávida come, o seu peso e outros hábitos de estilo de vida podem comprometer o desenvolvimento do sistema imunitário, metabolismo e órgãos do bebé. Atualmente, sabe-se que uma nutrição inadequada logo nos primeiros tempos de vida pode ter um impacto negativo e irreversível na saúde futura, mesmo na vida adulta. Esses efeitos podem ocorrer não só a nível de desenvolvimento cognitivo, como podem também traduzir-se num aumento da predisposição para algumas doenças crónicas, como:
Além disso, vários trabalhos de investigação têm demonstrado que o desenvolvimento das preferências alimentares do bebé começam ainda enquanto está no útero e que estas podem influenciar os seus hábitos de alimentação futuros.
Os efeitos do stress
Elevados níveis de stress durante a gravidez podem influenciar o sistema nervoso e o crescimento do bebé, o que, por sua vez, pode favorecer o desenvolvimento de problemas de saúde no futuro, tais como doenças cardíacas, obesidade, diabetes e hipertensão.
Embora nem sempre seja possível evitar situações de maior stress, é importante que nesses casos a mulher grávida ou mãe de um bebé procure ajuda e aconselhamento junto do seu médico assistente.
A interação com o bebé
Para que o bebé se desenvolva de forma saudável, há outros aspetos importantes, além da nutrição, a ter em consideração. É fundamental que, sobretudo nos primeiros 1000 dias de vida, a criança tenha relacionamentos seguros e afetuosos, pois estes acabam por ter um influência significativa na perceção que a criança tem em relação ao mundo que a rodeia. A interação com outras pessoas permite também que aprendam a pensar, compreender, comunicar, demonstrar emoções e a comportarem-se. Boas estratégias que podem fazer com que o bebé se sinta seguro e amado passam por fazer algumas atividades com ele: brincar, cantar, ler e conversar.
A pré-conceção também é importante
Mesmo antes da gravidez, o planeamento pode ajudar a garantir que tudo irá correr da melhor forma possível. Este é um fator muito importante não só para a saúde da mulher, como da criança. O primeiro passo deve sempre envolver a consulta com o médico assistente da mulher, que irá aconselhar os futuros pais acerca de todos os cuidados a ter e até prescrever exames se considerar necessário. O profissional de saúde avaliará também o risco que a grávida tem de vir ou não a desenvolver alguns tipos de doenças, como obesidade, diabetes ou hipertensão, e tomar as medidas adequadas.
Além disso, nesta fase é fundamental corrigir possíveis carências nutricionais, por exemplo, de:
- Vitamina B12 e D
- Iodo
- Ácido fólico
- Cálcio
- Ferro
A amamentação: mais do que alimento, é criar laços
O leite materno é um verdadeiro super alimento e deve ser oferecido ao bebé pela primeira vez até uma hora depois do parto. Sabia que este ajuda a construir a imunidade do bebé, além de ter um papel protetor da sua saúde, e atua como uma espécie de primeira vacina para a criança? Este alimento protege também o bebé de infeções, assim como de outras doenças - entre as quais a síndrome de morte súbita, diarreia, asma e pneumonia - e de vir a sofrer de obesidade mais tarde.
A nível cognitivo também há benefícios associados à amamentação: bebés que são assim alimentados já demonstraram ter melhores resultados em testes de inteligência e de QI realizados mais tarde, quando são já crianças ou adolescentes.
A amamentação é também um momento que reforça os laços entre a mãe e o seu filho. Uma vez que envolve um contacto muito próximo, é importante no fortalecimento de circuitos sensoriais e emocionais do bebé, que, por sua vez, desempenham um papel fundamental a nível de desenvolvimento cognitivo e socioemocional.
Tendo em conta todas estas vantagens, não é de surpreender que as recomendações sejam para que, sempre que possível, a mulher amamente o seu bebé de forma exclusiva até aos 6 meses de idade e depois até aos 2 anos de idade, associando o aleitamento à diversificação alimentar.
Sabia que...
Estima-se que a amamentação pode salvar a vida de mais de 820 mil crianças e 20 mil mulheres por ano.
Quando o bebé começa a comer outros alimentos
Entre os 4-6 meses de vida (quando faz aleitamento materno exclusivo), o bebé deve começar a consumir outros alimentos - como fruta, vegetais, cereais infantis fortificados com vitaminas e minerais, fontes de proteína e não só -, deixando o aleitamento de ser a sua forma exclusiva de alimentação. Esta é uma etapa de grande relevância, que ajudará a estabelecer os seus hábitos alimentares futuros e a garantir uma boa nutrição.
A quantidade de crianças em idade pré-escolar que sofre de excesso de peso e obesidade aumentou significativamente nos últimos anos. Um dos fatores que pode ter contribuído para este fenómeno trata-se da adoção de dietas pouco saudáveis ou práticas de alimentação inadequadas durante os primeiros 1000 dias de vida. Além das consequências negativas que o excesso de peso e obesidade podem ter na saúde da criança, estudos demonstram também que estes problemas de peso podem aumentar o risco de obesidade durante a idade adulta, assim como de doenças de coração, cancro, diabetes tipo 2, entre outras patologias.
Hábitos importantes nos primeiros 1000 dias do bebé
- Adotar uma alimentação saudável durante a gravidez
- Evitar fumar, ingerir bebidas alcoólicas ou consumir drogas
- Amamentar até aos 6 meses de idade do bebé, se possível
- Assegurar-se de que o bebé segue uma alimentação saudável
- Dar ao bebé muitos afetos e atenção para que se sinta seguro
- Se está a passar por alguma situação de violência ou trauma, procurar ajuda
1,000 Days, setembro de 2021
Associação Portuguesa de Nutrição, setembro de 2021
Pregnancy, Birth and Baby, setembro de 2021