Diabetes mellitus tipo 2

A diabetes mellitus tipo 2 (DMT2) é a forma mais comum de diabetes, sendo responsável por 95% de todos os casos. A obesidade é a causa mais importante de DMT2 e o crescimento alarmante da prevalência de diabetes está intimamente ligado à elevada prevalência de obesidade em todo o mundo.

A DMT2 causa múltiplas doenças e problemas de saúde, como sejam, doença cardiovascular, acidente vascular cerebral, cegueira (retinopatia), insuficiência renal, neuropatia, amputações, disfunção sexual, depressão, deterioração cognitiva e aumento da mortalidade por certos tipos de cancro. O risco de morte prematura por DMT2 está aumentado em cerca de 80% e a esperança de vida é reduzida em 12 a 14 anos.

A terapêutica atual da DMT2 inclui alteração do estilo de vida (perda de peso, dieta apropriada e exercício físico) e medicação antidiabética. O acompanhamento médico regular e a adesão estrita ao regime de tratamento prescrito podem ajudar a manter em níveis aceitáveis o açúcar no sangue, embora os fármacos atualmente disponíveis e as alterações do estilo de vida nunca levem à remissão da diabetes. Na verdade, a DMT2 tende a agravar-se com o tempo, obrigando frequentemente à associação de novos fármacos ou a aumentar a respetiva dose, para manter controlado o nível de açúcar no sangue. Por esta razão, a DMT2 foi considerada uma doença crónica e progressiva.

 

Alguns números relevantes:

  • A cada 10 segundos morre uma pessoa em todo o mundo por complicações relacionadas com a DMT2.
  • A diabetes é umas primeiras 10 causas de morte no mundo ocidental.
  • A diabetes consome cerca de 10% dos gastos com saúde.
  • Os doentes diabéticos gastam cerca de 2.3 vezes mais em cuidados de saúde do que os não diabéticos.
  • Se se mantiver a tendência atual, a DMT2 ou estado de pré-diabetes deverá atingir metade da população do mundo ocidental.
  • A prevalência da diabetes em Portugal é de 13%. Se a consideram a diabetes e estado de pré-diabetes (hiperglicemia intermédia), a prevalência em Portugal é de 40%.
  • A incidência da diabetes em Portugal é de 600 novos casos por 100 000 habitantes, por ano.
  • 90% dos casos de DMT2 é atribuível a excesso de gordura no organismo.
  • A cirurgia bariátrica e metabólica é a forma de tratamento mais efetiva para a DMT2 nos doentes que apresentam, concomitantemente, algum grau de obesidade e resulta em remissão ou melhoria da doença em quase todos os casos.

Cirurgia Metabólica

A cirurgia metabólica melhora a DMT2 em 90% dos doentes, baixando os níveis de açúcar no sangue, reduzindo a dose e o tipo de medicamentos necessários e melhorando os problemas associados à diabetes.

A cirurgia metabólica induz a remissão da DMT2 em 30-80% dos doentes (varia com a operação e o doente), normalizando os níveis de açúcar no sangue e eliminando a necessidade de medicação antidiabética.

Na maioria dos casos, os efeitos mantêm-se no médio e longo prazo (≥ 5 anos).

A cirurgia metabólica consiste num conjunto de operações que se realizam sobre o aparelho gastrintestinal com o objetivo de tratar a diabetes mellitus tipo 2(DMT2) e a obesidade.

Após o advento da cirurgia bariátrica nos anos 1950’s, observou-se que as operações inicialmente desenhadas para tratar a obesidade induziam a remissão da DMT2 numa grande percentagem de casos – mais do que seria de esperar pela resolução da obesidade. Na verdade, em alguns casos, estas operações eram mais eficazes a induzir remissão da DMT2 do que a tratar a própria obesidade.

Desde 2000, várias experiências confirmaram os efeitos diretos daquelas operações no metabolismo da insulina e da glicose e, desde então, a cirurgia passou a ser usada também para o tratamento da DMT2.

Desde 2016, as guidelines da American Diabetes Association (ADA) consideram a cirurgia metabólica como uma das alternativas terapêuticas a considerar no tratamento da DMT2.

Candidatos

De acordo com a 2nd Diabetes Surgery Summit, uma conferência internacional de consenso que decorreu em 2016 e reuniu um grupo multidisciplinar de 48 experts internacionais (60% dos quais endocrinologistas/diabetologistas), a cirurgia deve ser recomendada ou considerada para tratar a diabetes mellitus tipo 2 (DMT2) nos seguintes casos: 

  • Doentes com DMT2 e obesidade grau II ou III (IMC ≥ 35 kg/m2).
  • Doentes com DMT2 de difícil controlo e obesidade grau I (IMC 30 – 34.9 kg/m2).
  • Nos doentes de etnia asiática, descer aqueles valores de IMC em 2.5 kg/m2.

Intervenções

As operações que se realizam para tratar a diabetes são as seguintes:

  • Bypass gástrico em Y de Roux
  • Mini-bypass gástrico
  • Switch duodenal
  • Operação de Scopinaro
  • Gastrectomia sem "sleeve" com interposição ileal GS+II

Riscos

Toda a cirurgia tem risco associado e a cirurgia metabólica não é exceção.

De uma forma geral e resumida, os riscos inerentes à cirurgia metabólica são:

  • Necessidade de conversão de uma operação começada por cirurgia minimamente invasiva (laparoscópica ou robótica) em cirurgia convencional aberta. É uma ocorrência muito rara em centros especializados, mas que pode ser frequente em centros com menos experiência, sobretudo em cirurgia de revisão.
  • Insucesso terapêutico: acontece quando não se observa melhoria significativa da diabetes após a cirurgia. O insucesso terapêutico pode acontecer em até 10-20% dos casos, dependendo do tipo de procedimento realizado e, sobretudo, do comportamento do doente. 
  • Hemorragia
  • Deiscência (rotura) de suturas no estômago ou de suturas que fazem a ligação entre o estômago e o intestino. É um tipo de complicação rara, ou muito rara, em centros especializados, mas muito grave e de difícil tratamento, quando ocorre.
  • Obstrução intestinal por aderências ou hérnias internas.
  • Hérnia incisional de uma das incisões na parede abdominal.
  • Flatulência, fezes com cheiro fétido e diarreias. São muito raras no bypass gástrico em Y de Roux e na gastrectomia em sleevecom interposição ileal. São mais frequentes no switch duodenal e, sobretudo, na operação de Scopinaro.
  • Défices nutricionais. São muito raros na gastrectomia em sleeve com interposição ileal. Podem acontecer no bypass gástrico em Y de Roux, mas são de fácil tratamento; regra geral, não surgem carências proteicas. São mais frequentes no switch duodenal e, sobretudo, na operação de Scopinaro, podendo surgir carências proteicas difíceis de tratar.
  • Mortalidade: o risco de morte global (considerando todas as operações) em consequência de uma complicação da cirurgia metabólica é de cerca de 1‰: isto é, um em cada 1000 doentes operados. Este risco é francamente inferior ao que se observa em outras operações, algumas aparentemente mais simples, como retirar a vesícula, ou colocar uma prótese da anca. Se considerarmos apenas a operação mais frequentemente realizada, o bypass gástrico em Y de Roux, este risco reduz para menos de metade.

 

Para a operação realizada com mais frequência, o bypass gástrico em Y de Roux, a frequência global de complicações é de 2-5%; se considerarmos apenas complicações major (graves) a frequência é de 0.5-1%; no caso da cirurgia robótica a frequências de complicações major é inferior a 0.5%. Esta incidência de complicações é a que vem publicada na melhor literatura científica e corresponde à experiência do Centro de Tratamento Cirúrgico da Obesidade e Diabetes Tipo 2.

Fontes:

Carlos Vaz, Cirurgião Geral do Hospital CUF Tejo