Espinha bífida
O que é?
A espinha bífida é uma anomalia congénita do sistema nervoso que se desenvolve nos dois primeiros meses de gestação. Representa o defeito na formação do tubo neural (anomalias que ocorrem no desenvolvimento da medula espinal e do cérebro de alguns bebés) mais comum nos Estados Unidos, com uma incidência estimada em 1 em cada 1000 recém-nascidos. No entanto, ainda não existem dados estatísticos sobre a incidência de espinha bífida em Portugal.Estes defeitos são uma causa importante de mortalidade infantil. Nesta condição, ocorre um desenvolvimento incompleto do cérebro, da medula e das meninges.
Existem quatro tipos de espinha bífida:
- Oculta: a mais comum e ligeira.
- Defeitos fechados do tubo neural: de gravidade intermédia.
- Meningocelo: tal como a anterior, é de gravidade intermédia.
- Mielomeningocelo: é o tipo mais grave, em que a medula está exposta, ocorrendo paralisia parcial ou completa da zona do corpo situada abaixo da abertura da medula. Associa-se, ainda, a incontinência urinária e fecal.
Sintomas
Os sintomas de um portador de espinha bífida são muito variáveis, dependendo do tipo de anomalia. Os defeitos fechados são identificados mais precocemente pela presença de um tufo de cabelo ou de uma mancha na pele no local da malformação espinal.
No meningocelo e no mielomeningocelo forma-se um saco preenchido com líquido que faz saliência através da pele junto à coluna. Esse saco pode estar coberto por uma fina camada de pele (meningocelo) ou, sobretudo nos casos de mielomeningocelo, essa camada de revestimento está ausente, ficando o tecido anómalo completamente exposto.
Que impacto pode ter no doente?
A espinha bífida pode associar-se a diversas complicações, desde as mais ligeiras, como alguma limitação funcional, às mais graves com grave incapacidade física e mental. A maioria das pessoas com esta condição apresenta um nível de inteligência normal.
O impacto da espinha bífida depende do local e da dimensão da malformação, se está ou não revestida e quais os nervos envolvidos. Como regra, todos os nervos que se localizam abaixo da malformação estarão afetados em maior ou menor grau. Portanto, quando mais elevada for a localização da malformação, maior será a lesão nervosa e a perda de função motora e sensitiva.
Qual a relação entre espinha bífida e hidrocefalia?
Uma das complicações neurológicas associadas à espinha bífida é a malformação de Chiari II, sobretudo nas crianças com mielomeningocelo. Nesta malformação, o tronco cerebral e o cerebelo fazem protusão na região do canal espinal ou do pescoço, com compressão da medula e sintomas como dificuldade na alimentação, na deglutição e no controlo da respiração e alterações na função dos membros superiores (rigidez e fraqueza).
Neste caso, pode ocorrer ainda um bloqueio ao fluxo do líquido cefalorraquidiano, causando uma condição designada como hidrocefalia, na qual ocorre uma acumulação anormal desse líquido dentro e em torno do cérebro. Essa acumulação condiciona um aumento da pressão intracraniana, com lesão das estruturas cerebrais. A hidrocefalia é tratada mediante a colocação de um shunt no cérebro, que permite drenar o excesso de fluido para a cavidade abdominal.
Consequências em recém-nascidos e na vida adulta
Alguns recém-nascidos com mielomeningocelo podem desenvolver meningite que, por sua vez, pode causar lesão cerebral ou ser fatal. Quando ocorre mielomeningocelo e hidrocefalia, as crianças podem exibir dificuldades de aprendizagem e de atenção.
Numa fase mais avançada da vida, estes pacientes com espinha bífida podem desenvolver alergia ao latex, problemas cutâneos ou gastrintestinais e apresentam uma maior tendência para quadros depressivos.
Causas
As causas para o desenvolvimento de espinha bífida não são conhecidas.
Pensa-se que podem contribuir para esta condição fatores genéticos, nutricionais e ambientais.
Alguns estudos sugerem que uma ingestão insuficiente de ácido fólico pela mãe pode ser um fator-chave para o desenvolvimento de defeitos do tubo neural. Por essa razão, as vitaminas administradas no período pré-natal contêm sempre ácido fólico.
Diagnóstico
Na maioria dos casos, o diagnóstico da espinha bífida é realizado no período pré- natal. Contudo, alguns casos mais ligeiros podem ser detetados apenas depois do nascimento. No tipo mais suave (espinha bífida oculta), onde não existem sintomas, o diagnóstico pode nunca ser realizado.
O diagnóstico pré-natal é habitualmente realizado no segundo trimestre da gravidez através do doseamento no soro materno da alfa fetoproteína (MSAFP) e pela ecografia. A amniocentese pode ser também útil.
O diagnóstico pós-natal da espinha bífida é geralmente realizado através de um exame imagiológico (radiografia, tomografia computorizada ou ressonância magnética).
Tratamento
Não existe cura para a espinha bífida. O tecido nervoso que está lesado não pode ser reparado nem a função perdida pode ser restaurada. O tratamento irá depender do tipo e gravidade da doença.
Nas formas mais ligeiras de espinha bífida não é necessário qualquer tratamento, embora, nalguns casos, possa existir indicação cirúrgica quando as crianças forem mais velhas. Nos casos de mielomeningocelo, é essencial prevenir a infeção dos tecidos expostos e protegê-los de traumatismos.
Para lá da cirurgia, pode-se recorrer a diversos equipamentos que facilitem a locomoção e aumentem a autonomia das crianças afetadas. No caso da hidrocefalia, é implantado o tal shunt para drenar o líquido cefalorraquidiano. A fisioterapia é um complemento importante do tratamento desta condição.
Importância da cirurgia em crianças com espinha bífida
Por regra, as crianças com espinha bífida deverão ser submetidas a cirurgia para encerrar o defeito e minimizar o risco de infeção e/ou trauma.
Alguns centros clínicos realizam cirurgia pré-natal, ainda no útero. A vantagem teórica é uma correção mais precoce do defeito e um melhor prognóstico. Contudo, este é um procedimento ainda experimental.
Em cerca de 20 a 50% dos casos de mielomeningocelo, ocorre um bloqueio progressivo da medula, que fica presa a outras estruturas, como as vértebras, colocando a medula sob tensão à medida que a criança cresce. Daqui resulta perda da função muscular nas pernas e incontinência urinária e fecal. A cirurgia é essencial para libertar esse bloqueio e evitar uma ainda maior deterioração neurológica do portador de espinha bífida.
Prevenção
A ingestão de ácido fólico é um aspeto essencial para a prevenção do desenvolvimento de espinha bífida. Todas as mulheres em idade fértil devem ingerir cerca de 400 microgramas diariamente, através da sua dieta ou recorrendo a multivitamínicos.
No caso de mulheres com espinha bífida ou que já tenham tido um filho com espinha bífida, é recomendável uma ingestão diária de uma dose mais elevada de ácido fólico antes de considerarem uma gravidez.
Associação Spina Bífida e Hidrocefalia de Portugal, 2014
Mayo Foundation for Medical Education and Research, agosto 2014
National Institute of Neurological Disorders and Stroke, National Institutes of Health, fev. 2015
Pregnancy, Birth and Baby, maio de 2019