As evoluções no universo da radioterapia
A radioterapia é utilizada no tratamento de cerca de metade dos doentes com cancro. Três médicos explicam como é constituída a rede de equipamentos da CUF.
“Está descrito que 50 % dos doentes oncológicos vão precisar de radioterapia ao longo do percurso da sua doença”, afirma Gonçalo Fernandez, radioncologista CUF, salientando assim a aplicação considerável deste método no tratamento do cancro. Mas o que é, exatamente, a radioterapia? “É um tratamento que utiliza raio-X para realizar múltiplas soluções terapêuticas na área da Oncologia, mas também noutro tipo de soluções não oncológicas”, afirma Paulo Costa, também radioncologista CUF. Gonçalo Fernandez acrescenta: “É um tratamento que utiliza radiações ionizantes para eliminar um tumor ou para prevenir o seu reaparecimento. Para que haja o menor número possível de efeitos secundários dos tratamentos, a Radioterapia recorre a várias tecnologias disponíveis na rede CUF, para poupar os órgãos de risco e estruturas saudáveis.”
Neste vídeo, os radioncologistas Gonçalo Fernandez e Paulo Costa e o neurocirurgião José Brás explicam o que é a radioterapia, uma das opções de tratamento do cancro, e os diferentes equipamentos disponibilizados na rede CUF, que permitem abordagens personalizadas em função de cada caso e de cada doente.
Tecnologia: o braço direito da radioterapia
“O principal recurso da radioterapia é a tecnologia. Usamos equipamentos de elevada tecnologia para administrar radiação da forma mais segura possível e de forma a poupar os órgãos de risco e sermos muito precisos nos tratamentos”, afirma Gonçalo Fernandez. Muito importantes também são os softwares informáticos. Segundo o radioncologista, são necessários “grandes sistemas de informação para conseguirmos controlar a radiação e sabermos exatamente a dose que chega ao paciente em todas as estruturas de risco”. Esta precisão pode permitir não só prevenir o reaparecimento do tumor, mas também, caso exista tumor, reduzi-lo e eliminá-lo por completo.
A evolução da radioterapia
Nas últimas décadas, “a radioterapia sofreu uma enorme evolução”, afirma Gonçalo Fernandez, enumerando alguns desses avanços: “Começámos por conseguir modelar o feixe de tratamento e conseguimos, com uma precisão milimétrica, decidir o ponto de dose que queremos à volta do tumor e dentro do tumor. Outra área nos últimos dez anos que evoluiu muito foi a imagem guiada, que são todas as imagens que conseguimos obter antes do próprio tratamento ser efetuado e também durante. Isto permite-nos controlar de forma muito precisa todos os órgãos de risco, como é que o tumor vai evoluindo ao longo dos tratamentos, e vai-nos permitir o que chamamos de ‘radioterapia adaptativa’: ao longo do tratamento conseguimos adaptar os feixes do equipamento e a radiação em função do tipo de resposta que vamos ter e de como as estruturas saudáveis se vão adaptando a este tratamento.”
Mais eficácia e segurança, menos efeitos secundários
A evolução da radioterapia e o consequente aumento da sua eficácia e segurança traz naturalmente vantagens para o doente, sobretudo no que aos efeitos secundários diz respeito. Segundo Gonçalo Fernandez, “hoje, os efeitos secundários na radioterapia são altamente controlados. Conseguimos medir o risco da toxicidade nos nossos tratamentos e podemos avisar o doente desses mesmos riscos”.
Radioterapia no tratamento de metástases
“Cada vez mais temos situações de doença avançada em que a radioterapia pode proporcionar tratamento focal das lesões metastáticas que surgem na evolução da doença. Muito pelo advento das novas terapêuticas sistémicas, a doença oncológica tem-se vindo a tornar uma doença crónica e não uma doença evolutiva e rapidamente fatal”, explica Paulo Costa, acrescentando que, “à medida que temos uma doença que é crónica, mas que continua a evoluir de uma forma lenta e insidiosa, aquilo a que vamos assistindo cada vez mais e nas múltiplas áreas de patologia é que temos lesões que vão escapando àquilo que é a terapêutica instituída e que vão, na realidade, proporcionando situações de tratamento focais nas quais a radioterapia desempenha um papel absolutamente determinante. Na maioria das vezes, a radioterapia é a 'arma' de eleição não só pela localização, mas também pela volumetria dessas mesmas metástases”.
Uma rede de equipamentos para um tratamento personalizado
“A radioterapia é um tratamento altamente personalizado em função do doente e do objetivo desse tratamento”, afirma Gonçalo Fernandez, salientando, por isso, a importância de ter vários equipamentos de radioterapia que permitem essa personalização terapêutica. Fique a conhecer a rede de equipamentos de radioterapia da CUF, especializados em diferentes áreas a tratar:
Versa HD e Infinity
Hospital CUF Descobertas, Lisboa
São dois aceleradores lineares de alta tecnologia e de alta performance. “O versa HD é um acelerador muito versátil e com grande capacidade de administrar tratamento de elevada precisão”, explica Gonçalo Fernandez, acrescentando que o Infinity é um acelerador ‘gémeo’ do Versa HD, permitindo uma redundância na prestação de cuidados.
Gamma Knife
Hospital CUF Tejo, Lisboa
“A radiocirurgia Gamma Knife é um tratamento que usa radiações, feito em doentes que têm lesões cerebrais e em que administramos uma dose única de radiação, uma única sessão, num único tratamento e é exatamente para tratar estas lesões cerebrais”, esclarece José Brás, neurocirurgião, salientando que, “apesar do tratamento ter o nome de radiocirurgia, na verdade não há nenhuma cirurgia envolvida. É um tratamento não invasivo, em que basicamente vamos fazer exames ao doente, planear a aplicação de radiações, que é feita de forma muito precisa - daí o termo cirúrgico -, poupando sempre o tecido normal, tratando só a lesão”.
De acordo com o neurocirurgião, no Centro Gamma Knife - único no País - são tratados vários tipos de lesão, como tumores malignos cerebrais - neste caso, as metástases cerebrais provenientes de outros tumores - e alguns tumores benignos, nomeadamente:
- Neurinomas do nervo acústico
- Meningiomas
- Adenomas da hipófise
“Mas não nos esgotamos por aqui. Podemos também tratar algumas lesões vasculares, nomeadamente as malformações arteriovenosas, e outras patologias, nomeadamente a nevralgia do trigémeo. Em todos estes tumores, a nossa única limitação é o tamanho das lesões - tratamos lesões pequenas, localizadas dentro do cérebro, não podemos tratar lesões grandes”, explica.
Este tratamento pode ser praticamente feito em ambulatório, não precisando o doente de ficar internado nem de ser anestesiado, explica José Brás, acrescentando ainda outras vantagens: “Não existem neste tratamento as limitações que podem existir quando determinados doentes não podem fazer uma cirurgia. Se o doente tiver uma patologia ou fizer uma medicação que torna mais complicada a cirurgia, isto não acontece no tratamento com radiocirurgia. Além disso, no dia seguinte após o tratamento, o doente pode, se quiser, voltar à sua vida normal, sem qualquer limitação”. Também não é necessário qualquer tipo de preparação prévia ao tratamento.
CyberKnife
Instituto CUF Porto
“O CyberKnife é um equipamento inovador, que se distingue por ser um equipamento que está montado num braço robótico, o que lhe permite soluções terapêuticas que outras máquinas não têm a possibilidade de fazer, exatamente pelas suas limitações técnicas”, explica Paulo Costa.
Este equipamento “trata praticamente todos os tipos de tumor, inclusivamente lesões não tumorais - por exemplo, a nevralgia do trigémeo e as malformações arteriovenosas. Dentro das soluções de Oncologia, destacaria toda a radiocirurgia intracraniana e também a patologia pulmonar, a patologia de metastização hepática, a patologia pancreática e, não menos importante, a patologia da próstata”, afirma.
Técnicas inovadoras, com maior precisão
Além dos vários equipamentos de radioterapia disponíveis, existem também diferentes técnicas de tratamento, como por exemplo a SBRT - radioterapia estereotáxica extracraniana (ou Stereotatic Body Radiation Therapy) - e a braquiterapia:
- SBRT
“É uma técnica utilizada em todo o corpo e é uma forma de tratamento de elevada precisão. Distingue-se da radioterapia convencional porque é uma radioterapia muito precisa, que utiliza doses elevadas, que se destina a volumes muito definidos e a ser efetuada em poucas sessões de tratamento. Nomeadamente nas lesões mais típicas, sejam elas intracranianas ou extracranianas, entre uma a cinco sessões de tratamento”, explica Paulo Costa.
- Braquiterapia
Envolve a colocação de “uma fonte de radiação perto da área, tumor ou lesão que pretendemos tratar”, afirma Paulo Costa, esclarecendo que, “hoje em dia, a braquiterapia utiliza-se em múltiplas localizações, como as áreas da cabeça e pescoço, pulmonar, ginecológica, próstata e reto”.
Sabia que...
“A braquiterapia, embora seja uma técnica considerada ‘antiquada’, porque nasceu há mais de 100 anos, na realidade continua hoje a ser uma técnica de eleição em muitas patologias”, afirma Paulo Costa.
“Os carcinomas de cabeça e pescoço são tumores com grande impacto na vida dos doentes. É uma área muito sensível do nosso corpo, pois usamos esta região para falar, comunicar, respirar e nos alimentarmos. Muitas vezes, a cirurgia pode ter um papel muito limitante nesta área, sendo aí que a radioterapia entra, no sentido de poder dar um tratamento curativo aos doentes de forma a que consigam poupar todas estas funções e com o mínimo de efeitos secundários”, salienta Gonçalo Fernandez.
“Nos cancros urológicos, nomeadamente na próstata, existem várias modalidades de tratamento que dependem muito do estadio da doença”, afirma Gonçalo Fernandez. Paulo Costa completa: “A radioterapia, a par de outras estratégias de tratamento, proporciona uma opção de tratamento curativa. Ou seja, em conjunto, dependendo da situação em concreto de cada doente, a radioterapia desempenha hoje um papel fundamental no tratamento curativo do cancro da próstata” e “as vantagens da radioterapia são muitas. Quando se coloca uma fonte de radiação perto da área que pretendemos tratar, não temos efeitos de toxicidade acrescida nos tecidos circundantes à lesão. Essa é a grande vantagem da braquiterapia. Portanto, sempre que possível a braquiterapia tem de ser considerada como uma 'arma' que pode ser usada em conjunto com os outros tipos de radiação para obtermos a melhor solução de tratamento”. Além disso, “temos soluções em concomitância com outras terapêuticas, nomeadamente do ponto de vista de quimioterapia, de imunoterapia e inclusivamente de bloqueio hormonal neste tipo de situação”.
“No carcinoma da mama, há um impacto significativo na prevenção de recidivas”, destaca Gonçalo Fernandez, referindo que “a nível do cancro de mama, uma das inovações mais recentes é a radioterapia guiada por superfície. Conseguimos ver durante o tratamento como é que está posicionada toda a superfície corporal do doente e controlar o seu ciclo respiratório. Porque é que isto é vantajoso? Podemos fazer o tratamento com uma inspiração forçada da doente - Deep Inspiration Breath-Hold (DIBH) -, que nos permite afastar a radiação do coração e evitar complicações associadas ao coração, que as doentes podem desenvolver nos anos que se seguem”.
“Na patologia do pulmão tivemos uma enorme evolução nos últimos anos no que diz respeito a técnicas ablativas (ou seja, que 'destroem' os tumores) - como a radioterapia estereotáxica - que permitem numa só sessão ou em muito poucas sessões (três a cinco), eliminar o tumor. A radioterapia atua como se fosse um ato cirúrgico e num só ato conseguimos eliminar o tumor por completo, atingindo respostas completas. No que diz respeito ao tratamento do pulmão em geral, há uma enorme inovação na sinergia que a radioterapia tem com novas técnicas sistémicas, como a imunoterapia. Conseguimos, hoje em dia, com tratamentos menos tóxicos e mais controlados, concretizar terapêuticas que vão funcionar ao mesmo tempo que a imunoterapia, permitindo uma maior eficácia de ambos. Como consequência, aumentamos muito a sobrevivência do doente com patologia do pulmão, doentes que antigamente eram considerados não curáveis, hoje em dia são curáveis”.
“A radioterapia tem um grande impacto na prevenção do risco de recidiva nos sarcomas. É um grupo de patologia rara, na qual a radioterapia pode ter várias abordagens. Muitas vezes, usamos a radioterapia antes de uma cirurgia para fazermos o máximo esforço de redução tumoral e para termos uma cirurgia o mais 'limpa' possível, com menos taxas de recidiva nestes casos. Outras vezes, a radioterapia é usada como um tratamento adjuvante - ou seja, tratar após a cirurgia - caso tenham ficado algumas células que mais tarde podem ter risco de recidiva”, explica Gonçalo Fernandez.
Há cuidados a ter ao fazer este tratamento?
Os cuidados são tomados em função de cada paciente e abordados de forma individual pela equipa clínica, pois “cada doente reage de forma diferente aos tratamentos”. Por exemplo, segundo as explicações de Gonçalo Fernandez, pode ser necessário adotar algumas medidas a nível da dieta “durante o tratamento para minimizar os efeitos nos intestinos, ou, por exemplo, cuidados na pele, dependendo das reações cutâneas aos tratamentos”. Gonçalo Fernandez dá ainda como exemplo os doentes de cabeça e pescoço, em que “é necessário ter cuidado com a higiene oral assim como uma alimentação rica em nutrientes e proteínas para reduzir o risco de mucosites”. O cansaço é outro efeito que pode ser registado durante a radioterapia e “o doente deve ser orientado para que consiga fazer a sua vida o mais normal possível”, acrescenta.
Terminado o tratamento, é preciso ter cuidados específicos? “Depende muito de pessoa para pessoa e da forma como cada doente reage aos tratamentos. Não somos todos iguais. A radioterapia reduziu ao longo destes anos as toxicidades agudas e tardias dos tratamentos. Precisamos de ir vigiando o doente para ver como vai reagindo depois do tratamento ter terminado para conseguirmos minimizar esses efeitos”, salienta Gonçalo Fernandez.